quinta-feira, 19 de setembro de 2013
ÀBÍKÚ (nascer-morrer)
ÀBÍKÚ (nascer-morrer)
Só mesmo um grande mestre como Pierre Verger para nos tirar da ignorância sobre este tema, através da sua pesquisa e coragem,
cujo legado será eterno.
Se uma mulher, em país yorubá dá à luz uma série de crianças natimortas ou mortas em baixa idade, tradição reza que não se trata da vinda ao mundo de
várias crianças diferentes, mas de diversas aparições do mesmo ser (para eles, maléfico) chamado àbíkú (nascer-morrer)
que se julga vir ao mundo por um breve momento para voltar ao país dos mortos, órun (o céu), várias vezes.
Ele passa assim seu tempo a ir e voltar do céu para o mundo sem jamais permanecer aqui por muito tempo, para grande desespero de seus pais,
desejos de ter os filhos vivos.
Essa crença se encontra entre os Akan, onde a mãe é chamada awomawu (ela bota os filhos no mundo para a morte). Os ibo chamam os abikú de ogbanje,
os hauças de danwabi e os fanti, kossamah.
Encontramos informações a respeito dos abikú em oito itans (histórias) de ifá, sistema de adivinhação dos yorubá, classificados nos 256 odu (sinais de ifá).
Essas histórias mostram que os abikú formam sociedades no egbá órun (céu), presididas por iyàjansà (a mãe-se-bate-e-corre) para os meninos e olókó
(chefe da reunião) para as meninas, mas é Aláwaiyé (Rei de Awaiyé) que as levou ao mundo pela 1ª vez na sua cidade de Awayié. Lá se encontra a floresta
sagrada dos abikú, aonde os pais de abikú vão fazer oferendas para que eles fiquem no mundo.
Quando eles vem do céu para a terra, os abikú passam os limites do céu diante do guardião da porta, oníbodé órun , seus companheiros vão com ele até o local onde
eles se dizem até logo. Os que partem declaram o tempo que vão ficar no mundo e o que farão. Se prometem a seus companheiros que não ficarão ausentes, essas,
crianças apesar de todo os esforços de seus pais, retornarão, para encontrar seus amigos no céu.
Os abikú podem ficar no mundo por períodos mais ou menos longos. Um abikú menina chamada "A-morte-os-puniu" declara diante de oníbodé órun que nada do
que os seus pais façam será capaz de retê-la no mundo, nem presentes nem dinheiro, nem roupas que lhes ofereçam, nem todas as cosias que eles gostariam de fazer por ela
atrairiam os seus olhares nem lhe agradariam.
Um abikú menino, chamado ilere, diz que recusará todo alimento e todas as coisas que lhe queiram dar no mundo. Ele aceitará tudo isto no céu.
Quando Aláwaiyé levou duzentos e oitenta abikú ao mundo pela primeira vez, cada um deles tinha declarado, ao passar a barreira do céu, o tempo que iria ficar no mundo. Um deles se propunha a voltar ao céu assim que tivesse visto sua mãe; um outro, iria esperar até o dia em que seus pais decidissem que ele casasse; um outro, que retornaria ao céu, quando seus pais concebessem um novo filho, um ainda não esperaria mais do que o dia em que começasse a andar.
Outros prometem à iyàjanjasà, que está chefiando a sua sociedade no céu, respectivamente, ficar no mundo sete dias, ou até o momento em que começasse a andar ou quando ele começasse a se arrastar pelo chão, ou quando começasse a ter dentes ou ficar em pé.
Nossas histórias de ifá nos dizem que oferendas feitas com conhecimento de causa são capazes de reter no mundo esses abikú e de lhes fazer esquecer suas promessas de volta, rompendo assim o ciclo de suas idas e vindas constantes entre o céu e a terra, porque, uma vez que o tempo marcado para a volta já tenha passado, seus companheiros se arriscam a perder o poder sobre eles.
É assim que nessas quatro histórias encontramos oferendas que comportam um tronco de bananeira acompanhado de diversas outras coisas. Um só dos casos narrados, o terceiro, explica a razão dessas oferendas:
"Um caçador que estava à espreita, no cruzamento dos caminhos dos abikú, escutou quais eram as promessas feitas por três abikú quanto à época do seu retorno ao céu."
"Um deles promete que deixará o mundo assim, que o fogo utilizado por sua mãe, para preparar sua papa de legumes, se apague por falta de combustível. O segundo esperará que o pano que sua mãe utilizar, para carregá-lo nas costas se rasgue. A terceira esperará, para morrer, o dia em que seus pais lhe digam que é tempo de ele se casar e ir morar com seu esposo."
"O caçador vai visitar as três mães no momento em que elas estão dando à luz a seus filhos abikú e aconselha à primeira que não deixe se queimar inteiramente a lenha sob o pote que cozinha os legumes que ela prepara para seu filho; à segunda que não deixe se rasgar o pano que ela usar para carregar seu filho nas costas, que utilize um pano de qualidade diferente; ele recomenda, enfim à terceira, de não especificar, quando chegar a hora, qual será o dia em que sua filha deverá ir para a casa do seu marido."
As três mães vão, então consultar a sorte, ifá, que lhes recomenda que façam respectivamente as oferendas de um tronco de bananeira, de uma cabra e de um galo, impedindo, por meio deste subterfúgio, que os três abikú possam manter seu compromisso. Porque, se a primeira instala um tronco de bananeira no fogo, destinado a cozinhar a papa do seu filho, antes que ele se apague, o tronco de bananeira, cheio de seiva e esponjoso, não pode queimar, e o abikú, vendo uma acha de lenha não consumido pelo fogo, diz que o momento da sua partida ainda não é chegado. A pele de cabra oferecida pela Segunda mãe serve para reforçar o pano que ela usa para levar seu filho nas costas; a criança abikú não vai achar nunca que esse pano se rasgou e não vai poder manter sua promessa. Não se sabe bem o porque do oferecimento de um galo, mas a história conta que quando chegou a hora de dizer à filha já uma moça, que ela deveria ir para casa do seu marido, os pais não lhe disseram nada e a enviaram bruscamente para a casa dele.
Nossos três abikú não podem mais manter a promessa que fizeram, porque as circunstâncias que devem anunciar sua partida não se realizaram tais como eles tinham previsto na sua declaração diante de oníbodé órun. Estes três abikú não vão mais morrer. Eles seguiram um outro caminho.
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